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As aparências enganam – Jornal Correio

Quem vê cara não vê coração. Eu, por exemplo. Tenho cara de quem nunca sofreu enxovalho e Sol em Capricórnio, signo considerado frio e calculista. Mas choro até com comercial de margarina e já comprei, mesmo sem ter um tostão no bolso, um lote de frente para o mar para abrigar uma comunidade hippie.

Verdade seja dita, não cheguei a pagar nada pelo tal terreno, e nem teria como, mas nossos planos (peixe espada, peixe luz…) eram muito bons. Também não uso margarina e nem me emociono com a tradicional família brasileira. Quem olha para mim, até pensa que tive, que tenho, uma existência “a pão de ló”.

Que nem é um pão, vejam só. O velho ditado popular já começa indigesto. Pão de ló é o nome de um bolo sem fermento, que costuma ser descrito como “esponjoso” em sites de receitas. Dizem que o doce foi criado pelo chef italiano Giovan Battista Cabona em homenagem ao rei Fernando VI, da Espanha.

Na real, o coração de uma pessoa nunca está na cara. Esse é o fermento dos círculos virtuosos e dos clubinhos de algozes. Lá vão eles, os admiráveis, mobilizados em prol de uma inconfessável reserva de brioches. Aos que se consideram nobres, biscoitos finos. Aos demais, cortem-lhes as cabeças!

Mas, voltando ao pão de ló, será que o chef Cabona fez mesmo “o seu melhor” para agradar à realeza? Sei, não. Bolo sem fermento parece cilada, Bino. Que os clubistas mimem seus reis e rainhas. Soul demerara food. Rapadura é doce, mas não é mole, diz a sabedoria das feiras livres. Peace and Love.

Sempre há quem ande por aí quebrando dentes. Compadre Washington rules. Sabem de nada, inocentes. Quem vê instagram não vê corre. Paisagens e rostos com filtros. A vida, meus amigos, é como aquela frase de Nelson Rodrigues: “com sorte você atravessa o mundo. Sem sorte você não atravessa a rua”.

Com sorte, você acorda um dia para dentro, a tempo de perceber quem só te abraça quando precisa usar a sua roupa como toalha para secar as mãos (essa vi num meme). Sem coração, cara que nem coça. Com sorte, você chega em segurança ao outro lado da rua, aquela que você conhece e que te acolhe.